O projeto de lei nº 412/2022, que busca regulamentar o mercado de carbono no Brasil, foi aprovado em 04 de outubro de 2023 por unanimidade na Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal, em caráter terminativo, e segue para aprovação na Câmara dos Deputados.
O texto propõe o estabelecimento do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), ambiente regulado submetido ao regime de limitação das emissões de gases do efeito estufa (GEE) e de comercialização de ativos representativos de emissão, redução ou remoção de GEE, com o objetivo de cumprir com as previsões da Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº12.187/2009) e com os compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.
Sujeitos da regulação
Diferentemente do proposto por outros projetos de lei que visam regulamentar o mercado de carbono no Brasil, o projeto de lei nº 412/2022 não define os agentes regulados com base nos setores da economia, mas com base em um limiar mínimo de emissões. Nesse caso, os limiares de participação obrigatória propostos são de 10 mil e 25 mil toneladas de CO2 equivalente por ano por fonte ou instalação e se aplicam igualmente a todos os setores da economia, com exceção da produção primária agropecuária que foi expressamente excluída.
São considerados operadores regulados as pessoas físicas ou jurídicas responsáveis por fontes ou instalações que emitam acima de 10 mil toneladas de CO2 equivalente por ano. Tais operadores deverão reportar suas emissões e aqueles responsáveis por fontes e instalações que emitam acima de 25 mil toneladas de CO2 por ano, além do reporte obrigatório, deverão realizar a conciliação periódica de obrigações.
A conciliação periódica de emissões se dará por meio da comprovação pelo operador regulado da titularidade de Cotas Brasileiras de Emissões (CBE), ativo representativo de direito de emissão de uma tonelada de CO2, e de Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões, ativo representativo da efetiva redução de emissões ou remoção de gases de efeito estufa de uma tonelada de CO2 registrado no SBCE, em quantidade igual às emissões líquidas incorridas no período.
Governança do SBCE
A governança do SBCE será composta pelo Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM), órgão gestor e Comitê Técnico Consultivo Permanente (CTCP). Cabe destacar que o texto aprovado não estabelece quem será o órgão gestor.
O CIM é o órgão deliberativo responsável pelo estabelecimento de diretrizes gerais do SBCE, enquanto o órgão gestor será o responsável por operacionalizar o sistema e regular o mercado, cabendo a ele, dentre outras competências, definir as atividades, fontes, instalações e gases a serem regulados em cada período de compromisso e elaborar e implementar o Plano Nacional de Alocação, após a aprovação do CIM.
Ao CTCP, formado por representantes da União, dos estados e de entidades setoriais representativas dos operadores, da academia e da sociedade civil, com notório conhecimento sobre a matéria, compete apresentar subsídios e recomendações para aprimoramento do sistema.
Plano nacional de alocações
Um instrumento central para a operacionalização do SBCE é o Plano nacional de alocação que deverá estabelecer, para cada período de compromisso, entre outros elementos:
- O limite máximo de emissões;
- A quantidade das CBEs a ser alocada entre os operadores;
- As formas de alocação das CBEs, gratuita ou onerosa;
- O percentual máximo de Certificados de Redução ou de Remoção Verificada de Emissões admitidos na conciliação periódica de obrigações.
Como forma de manter o alinhamento entre os operadores, é previsto que o Plano Nacional de Alocação deverá ter abordagem gradual entre os períodos de compromisso e ser aprovado com antecedência de, pelo menos, 12 meses antes de sua vigência.
Ainda, o plano poderá estabelecer tratamento diferenciado para determinados operadores ou setores econômicos em razão de particularidades inerentes às atividades desenvolvidas, seu faturamento, níveis de emissão líquida e localização, entre outros critérios estabelecidos em ato específico do órgão gestor do SCBE.
Infrações e penalidades
O projeto de lei prevê que as infrações administrativas por descumprimento das regras do SBCE serão estabelecidas em ato do órgão gestor e fixa as possíveis penalidades aplicáveis, dentre elas, multas de até 5% do faturamento bruto da empresa, embargo da atividade, fonte ou instalação, suspensão parcial ou total de atividade, fonte ou instalação, além de penalidades restritivas de direito como cancelamento de licença e proibição de contratar com a Administração Pública.
Conexão com o mercado voluntário
É prevista a possibilidade de créditos de carbono, conceituados como “ativos transacionáveis, representativos de efetiva redução de emissões ou remoção de uma tonelada de dióxido de carbono equivalente, obtida a partir de projetos ou programas de redução ou remoção de gases de efeito estufa, realizados por entidade pública ou privada, submetidos a metodologias nacionais ou internacionais que adotem critérios e regras para mensuração, relato e verificação de emissões, externos ao SBCE”, serem admitidos como Certificado de Reduções ou Remoções Verificadas de Emissões e, portanto, poderem ser utilizados para fins da conciliação periódica de obrigações.
Para isso, será necessário que os créditos de carbono atendam determinados requisitos e sua utilização deverá se restringir ao limite máximo definido no Plano Nacional de Alocação.
Além disso, há previsão de que os créditos de carbono quando negociados no mercado financeiro e de capitais terá natureza jurídica de valor mobiliário, sujeito ao regime da Lei nº6.385/1976.
Direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais
Apesar de o projeto ter como objetivo estabelecer o SBCE, também são estabelecidos parâmetros para o funcionamento do mercado voluntário de carbono, especialmente no que se refere aos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais, prevendo que seus direitos à comercialização dos créditos de carbono gerados em áreas tradicionalmente por eles ocupadas devem ser garantidos, bem como o cumprimento de salvaguardas socioambientais e o consentimento resultante da consulta livre, prévia e informada.
Implementação do SBCE
O SBCE será implementado por fases, sendo a primeira delas a regulamentação que deverá ser editada em até 12 meses, prorrogáveis por igual período, seguida por três anos para operacionalização até o início da vigência do primeiro Plano Nacional de Alocação.
A aprovação do texto no Senado é um passo importante para a criação de um mercado regulado brasileiro que vem sendo discutido há muito tempo e mais intensamente desde 2021.
Durante a votação na Comissão de Meio Ambiente, o senador Jaques Wagner, líder do governo no Senado, reafirmou a intenção do Governo Federal de aprovar definitivamente o projeto antes da 28ª Conferência das Partes que acontecerá em Dubai a partir do dia 30 de novembro.